Gideões Missionários da Última Hora - história e polêmicas

Recentemente, o jornal O Globo publicou uma matéria especial intitulada A fé que move as cidades. Segundo o periódico carioca, 334 municípios no Brasil, em alguma época do ano recebe milhares de turistas religiosos. Muitas dessas cidades, além de duplicar sua população em um único fim de semana, tem sua economia movimentada expressivamente nos eventos.

O Globo citou como exemplos de intenso turismo religioso católico as cidades de Aparecida (SP), Belém (PA), Juazeiro do Norte (CE), Trindade (GO), e do lado espírita Palmelo e Abadiânia no interior de Goiás.

Não há citação aos eventos evangélicos, mas o crente bem informado, ao ler matéria logo vai lembrar do "maior evento missionário do Mundo", o Gideões Missionários da Última Hora (GMUH). Realizado há mais de 30 anos na cidade de Camboriú (SC), o GMUH é uma organização paraeclesiástica ligada a Assembleia de Deus local, presidida pelo veterano pastor Cesino Bernardino.

Pastor Cesino ao assumir a igreja de Camboriú em 1977, o campo contava apenas com 600 membros e estava em crise espiritual e financeira. Para solucionar os problemas, Bernardino colocou os membros em campanha de oração e organizou uma equipe de obreiros para ministrar nas congregações sobre o batismo no Espírito Santo.

O sucesso da campanha, dentro e fora de Camboriú, mais algumas profecias indicavam, que naquela pequena cidade, uma grande obra se formaria. Convencido das promessas divinas Cesino criou no início da década de 1980, o 1º Encontro de Missões. As reuniões cresceram de forma extraordinária atraindo pessoas de várias partes do Brasil.


GMHU nos anos 80: ainda era calma a romaria de fieis

A princípio, o congresso enfrentou resistências. Porém, diante de eloquentes pregadores e de cantores carismáticos, somado as emotivas apresentações dos jograis com mensagens missionárias, muitos crentes de outras regiões começaram frequentar e bancar o GMUH.

Contribuía também para a expansão do Gideões o programa de rádio Voz Missionária, onde Cesino e uma boa equipe de comunicação, apresentava relatórios e divulgava o trabalho durante todo o ano. Assim, mais e mais pessoas se comprometiam com o GMUH.

Todavia, não tardou a surgir oposições ao projeto missionário. Afinal, as ofertas enviadas pelos crentes poderia muito bem ir para o caixa das igrejas locais. Essa tensão sempre era explicitada por Bernardino nos congressos e servia de combustível para a expansão do departamento. Com o tempo, o GMUH começou a fazer parcerias com igrejas e ministérios, e estendeu suas ações com obras sociais de suma importância.


Cesino e Reuel: sucessão garantida

Aliás, pastor Cesino Bernardino era um obreiro conservador em termos de usos e costumes. Deixava bem claro que não enviaria missionários fora dos padrões de "santidade" das ADs. Era um líder amado e respeitado pela AD em Camboriú. Revelava de púlpito nos congressos as lutas familiares que enfrentava com filhos desviados da igreja.

O congresso missionário a cada ano atraía mais gente por diversos motivos. Para muitos preletores, o convite para pregar no GMUH era o ápice do ministério. Aos cantores seria uma excelente vitrine para divulgação dos seus produtos. E para muitos políticos (crentes ou não) estar em Camboriú era sinal de visibilidade e possíveis votos.

Para a cidade, o GMUH gerou um belo incremento na renda comercial. A arrecadação para o município de Camboriú nos anos de 2010 a 2014, através da denominada "Taxa Gideões" cresceu 671%. Isso sem contar os vendedores ambulantes e alugueis de casas e apartamentos na região.

Porém, nada é perfeito neste mundo. Com o passar dos anos, o famoso congresso se tornou alvo constante de polêmicas. Para os estudiosos mais sérios, o GMUH é um foco de heresias e modismos. Métodos questionáveis de arrecadação financeira são utilizados durante os dias de festa. O próprio Cesino confessou publicamente a existência de drogas, álcool e prostituição entre os cantores e pregadores convidados. Algo lamentável.

Na esteira das mudanças veio o nepotismo. Depois de ter vários vice-presidentes, Bernardino encontrou o sucessor no filho Reuel Bernardino. Outros parentes agregam-se na instituição. Enquanto isso, pioneiros do GMUH reclamam do esquecimento. 

Nota-se certo culto à personalidade nessa fase dos Gideões. A figura do filho está sempre colada ao lado do pai. Os gestos e as práticas do herdeiro são semelhantes ao do patriarca. Tudo devidamente divulgado pelos meios de comunicação do grupo. 

Fica a dúvida: Reuel, além da igreja e do Gideões, herdará também o carisma do pai?

Fontes:

PAGANELLA, Umberto Grando. O Congresso dos Gideões Missionários: turismo religioso? Um estudo das interferências na infraestrutura viária e na paisagem urbana da área central de Camboriú (SC) durante o evento. Dissertação de Mestrado - Universidade do Vale do Itajaí (Univali).

www.ieadcamboriu.com.br/historico/

www.gideoes.com.br/historia

Comentários

  1. As mudanças no GMUH nota-se nas listas de pregadores. Nos primeiros anos eram 3 ou 4 pregadores e cada um pregavam em dois períodos diferentes. Hoje, pra ter noção, só no congresso desse ano tinha na lista mais de 100 nomes.

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  2. Xiiiii,nem vou comentar.
    Mas voltei na minha adolescência, onde eram distribuídos os pequenos Novos Testamentos cinza. Eita !!! Tempo que não voltam mais.
    Doces recordações, obg professor!

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    1. Não confundir "Gideões Missionário da Última Hora-GMUH" com os Gideões formado por empresários,profissionais liberais,que doam tempo e dinheiro,e distribuem os Novos Testamentos em escolas,hospitais,presídios,etc.

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  3. Do meu lado, o do Catolicismo Romano, o tal turismo religioso e a grana que entra nos cofres de minha cidade de Belém, capital do Pará, mencionada nesse post, durante o Círio de Bazaré, mostra a religiosidade dita popular com pessoas cometendo excessos ascéticos e sacrificiais, quando, por exemplo, andam de joelhos pelo asfalto quente em direção ao destino final da procissão anual. Todo esse evidente desconhecimento da maravilhosa graça divina é mostrado pelas emissoras de TV locais e é vendido como souvenir e folclore local.

    Eu tenho para mim que o Cristianismo é algo que fala com sentido muito mais ao indivíduo, aos corações e à subjetividade. Quando o Cristianismo extrapola para a sociedade sempre encontramos distorções. Acho que os cristãos verdadeiros serão sempre os últimos românticos e os primeiros homens modernos subjetivistas.

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  4. Corrigindo o erro de digitação: o correto é Círio de Nazaré*.

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  5. Como alguém, que se diz espiritualista, se autoriza criticar, (o que estou fazendo aqui) a fé, religião, credo ou denominação religiosa alheia? É surpreendente a frequência de comentários radicais nesse sentido. Mario Tolla

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