Aniversário de pastor - críticas de João de Oliveira

Há eventos dentro das Assembleias de Deus, que de tanto tempo instituídos até parecem ser uma "obra da natureza", ou seja, uma tradição inquestionável. O sociólogo Gedeon Alencar, em seu livro "Matriz Pentecostal Brasileira", destacou que no período de 1946 a 1988, consolidou-se dentro das ADs as tradições. Práticas essas (citando o historiador Éric Hobsbawn) "inventadas" para, em geral, consolidar algum interesse.

Porém, naquelas décadas de crescente institucionalização assembleiana, ainda havia espaço para contestações nos periódicos da CPAD. Alguns pioneiros sempre se manifestavam sobre determinados temas através do Mensageiro da Paz ou da revista A Seara. Bons debates foram travados na imprensa denominacional, onde os diversos pontos de vista eram explicitados. 

Um dos questionamentos que veio a público, foi algo muito popular hoje em dia nas igrejas: as comemorações de aniversário dos pastores. E ironicamente, a objeção veio nas páginas d'A Seara, que tinha por hábito divulgar esse tipo de celebração.

Aniversário do pastor Corrêa: ainda no tempo da simplicidade

O artigo "Deve a igreja promover aniversário de pastor?" escrito pelo pastor João de Oliveira levantou criticas sobre esse tipo de evento nas igrejas. No entender do veterano obreiro, sempre apareciam no "seio da cristandade, coisas que consideradas à luz dos Evangelhos estão fora do plano divino e muitas vezes essas coisas entram e crescem fortes raízes, tornando-se até como 'doutrina'...".

Na visão do pastor Oliveira, combatia-se tantas coisas necessárias à igreja como institutos bíblicos, caixa de auxílio de obreiros, orfanatos, escolas, etc. Mas as "festículas" com propósitos de agradecer a Deus pela vida do pastor, as quais acabavam por exaltar de forma exagerada a figura do líder, não eram contestadas. 

Pastor João comentou sobre exageros do tipo "jogar pétalas de flores" e de "recitais de honra ao mérito". Afirmou não ser contra as celebrações na igreja ou em família. É provável, que a preocupação do obreiro era com àquilo que hoje conhecemos como "culto à personalidade". 

O pastor Oliveira chegou a ironizar certa comemoração do natalício de um pastor, onde houve alegria e "festejos" e tempos depois "já havia luta pela saída dele da igreja". A própria experiência do articulista parece não ter sido muito boa nesse sentido. 

João de Oliveira fez suas observações em 1968. Faleceu aos 69 anos em 1980, quando a denominação ainda não havia entrado em sua fase de "aggiormento" (termo italiano, que significa atualização) conceito desenvolvido pelo historiador Moab César Carvalho Costa em seu livro "O Aggiornamento do pentecostalismo brasileiro"O que diria ele atualmente ao ver as suntuosas festas e o glamour de certos eventos natalícios em algumas igrejas e ministérios da atualidade? 

Os pastores merecem reconhecimento pelo seu árduo trabalho? Óbvio que sim. Mas nunca as celebrações de aniversário dos ministros evangélicos revelaram tanto o distanciamento social entre os líderes e membros da igreja. As ofertas e presentes oferecidos nas efemérides eclesiásticas fazem o "jogar pétalas de flores" e os "recitais de honra ao mérito" citados pelo pastor Oliveira algo pueril.

Nas celebrações é flagrante o endeusamento dos líderes e das famílias pastorais. O que começou como ações de graças pela vida do pastor, hoje faz parte da agenda oficial dos ministérios. E ai do obreiro que faltar ou não levar a oferta...

Fontes:

ALENCAR, Gedeon Freire de. Matriz Pentecostal Brasileira: Assembleias de Deus 1911-2011. Novos Diálogos: Rio de Janeiro, 2013.

COSTA, Moab César Carvalho. O Aggiornamento do Pentecostalismo Brasileiro: as Assembleias de Deus e o processo de acomodação à sociedade de consumidores. São Paulo: Editora Recriar, 2019.

A Seara, nº 68, junho/julho de 1968, p.39.

Comentários

  1. Aqui no estado de São Paulo, com perdão da palavra, dá até nojo, as comemorações de aniversário de pastor presidente. Os homens são endeusados

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  2. Depois pregamos contra a idolatria dos Católicos Romanos. Que moral temos para isso? Se não adotamos a mariolatria, sem dúvida somos adeptos do culto a personalidade, onde a figura do Pr Presidente é endeusada e as pobres congregações são obrigadas a levar vultuosas somas de dinheiro para ofertar "voluntariamente".

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    1. É desse jeito meu companheiro, passei por isso quando era dirigente de congregação.

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    2. Concordo plenamente com os irmãos.
      De uns anos para cá, só se vê os envelopes recheados com as lágrimas e sofrimento das congregações em serem "obrigados a doar" vultosas somas para "presentear" os milionários pastores presidentes que gastam o que querem,é nem tocam em seus "MARAVILHOSOS SALÁRIOS ".
      PERCEBO QUE SAO HOMENS DE POUCA FÉ, pois se tivessem fé acordariam cedo e teriam a honra de trabalhar e sentir na pele os gostinho do pão de cada dia.
      Não vejo motivo algum para que não trabalhem,visto que os dirigentes de congregação trabalham e fazem o mesmo que o pastor presidente "dirigir o cullto".
      Esses presidentes dormem até o sol do meio o dia e a tarde descansam...
      Francamente,é muita mordomia pra nada.vivem da fé dos irmãos .
      Espero que nada disso passe impune diante do tribunal de Cristo Jesus.

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  3. Nunca li nas escrituras, as igrejas plantadas por Paulo celebrarem festas exageradas em sua honra. Quando escreve aos Filipenses, agradece modestamente os auxílios recebidos considerando-os sua coroa, o motivo de sua obra. Não há registros de festas a Pedro, a Tiago, a João, muito menos a Cristo que quando ia a festas mais servia que era servido. Hoje despendiam-se recursos da obra para festividades dispensáveis. Não sou contra honrarmos os pastores pelo trabalho que eles realizam, o que incomoda é o dispêndio de recursos financeiros e humanos para esse fim, quando muitas vezes se solicita a visita a um enfermo e não há quem o faça. A igreja não pode perder sua característica primordial que é pregar o evangelho e buscar nos valados e becos os doentes e necessitados e ampará-los à luz das Escrituras Sagradas. Não podemos deixar que nosso respeito pelos líderes se transforme em idolatria extrapolando os limites da ética e da doutrina, pois o que ocorre nos templos, muitas vezes, pouco difere dos tributos aos ídolos mundanos.

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    1. Hoje em dia só encontro alguma igreja que ainda sobreviva as doutrinas de outrora nos interiores rurais com raríssimas exceções

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  4. E os envelopes que as congregações "devem levar" somam um vultuoso valor em dinheiro para pastores que tem um salário de marajá.

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  5. E infeliz mente e assin ainda um dia desses fui no culto e era aniversario de um pastor e o nome de jesus nao foi falado a metade das vezes que foi falado o nome do pastor quanta bajulaçao

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  6. Os mesmos que tinham a iniciativa em comemorar o aniversário do pastor ainda são os mesmos que falam mal e pedem sua saída. Muito cuidado com aqueles que elogiam em público e agem maldosamente pelas costas. Eu vivi isto com o meu pai...

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  7. Conheci um pastor no Nordeste, que recebia tanto presente que não sabia o que fazer com eles, então, segundo alguns irmãos, decidiu que montaria uma loja quando fosse jubilado.
    Nesse mesmo Estado, onde havias pastores que ganhavam de 30 a 50 salários mínimos, tinham a "coragem" de mandar um obreiro para o sertão e ajudá-lo com a "gorda" quantia de meio salário mínimo .

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